29/11/08

Opiniões

A Ministra e o Cozinheiro


Entrevista a João Lobo Antunes

Tudo na mesma...

Porque é que ainda não foi revelada a lista de accionistas e depositantes do BPP? Talvez porque encontraríamos nomes sobejamente conhecidos, a começar por aqueles ligados ao poder, passando pelos seus colaboradores directos e terminando nos amigos e familiares…
Um banco cujos clientes têm um saldo médio de €250 000, precisa de ser ‘salvo’ pelo Zeca da classe média; é que as elites também precisam de comer, principalmente caviar ao pequeno-almoço e lagosta ao almoço…
É terrivelmente frustrante constatar que ao longo dos séculos o essencial não mudou: uma minoria de endinheirados que manipula e usa o trabalho da maioria de remediados para manter a sua vida opulenta…
E depois afirma-se incompreensão em relação a pessoas que pegam em armas e atacam os centros de luxo das cidades, matando indiscriminadamente. A continuada injustiça alimenta ondas de revolta e ódio que acabam por rebentar nas rochas da frustração…

22/11/08

Lista de injustiças educativas

Devido aos tempos de crispação que continuam, importa referir que a avaliação é apenas um dos motivos da revolta que surgiu; como disse John Steinbeck, “a injustiça é a mãe de todas as revoltas”, pelo que o verdadeiro problema começou com o estatuto da carreira docente (ECD) e a divisão artificial da carreira em duas categorias: titular e não titular (suplente). Enumera-se as injustiças que geraram a revolta:

- Aumento da idade da aposentação (que no ensino não superior com a tipologia de alunos que existe é desumano, já não falando no aspecto de cidadania);
- Congelamento ad eternum da carreira (com o estabelecimento de quotas para professor titular, 70% dos professores terminarão a sua carreira no 5º escalão, independentemente das classificações de avaliação que tiverem ao longo da carreira, mesmo que Excelentes. As consequências da continuação durante décadas no mesmo escalão no cálculo da pensão de reforma serão catastróficas…)
- Perda de tempo de serviço e congelamento salarial (com a alteração na estrutura da carreira e adicionando o tempo de congelamento, muitos docentes vão ficar no mesmo escalão, em média, 8 anos. Desde de 1998 que não existem aumentos reais do salário, com a correspondente perda de poder de compra)
- A citada divisão em duas categorias (o professor titular tem a mesma competência funcional que o professor suplente: tem turmas, muitas vezes do mesmo nível de ensino do avaliado, executa as mesmas tarefas lectivas e não lectivas (exceptuando avaliar outros professores), trabalham nos mesmos órgãos escolares. A analogia do general e soldados é uma falácia; só pode haver um general porque executa funções diferentes dos soldados…
Sendo o conteúdo funcional o mesmo, a legitimidade dificilmente será reconhecida pelo avaliado; esta legitimidade moral está posta em causa desde o início porque os actuais titulares nunca se sujeitaram a um modelo de avaliação idêntico para atingir o lugar que ocupam, tendo lá chegado por via administrativa. Além disso, o concurso de titulares apenas considerou os últimos 7 anos de carreira, castrando toda uma vida de trabalho…
Curiosamente, um avaliado que preencha alguns requisitos, pode candidatar-se ao cargo de Director ou ser nomeado Subdirector, mas não pode ser titular por imposição de quotas; ou seja, como o Director é avaliador do titular, então existe a hipótese de um avaliado poder ser avaliador do seu avaliador…)
- Regime de faltas (penalização dos casos de doença, maternidade, paternidade, etc., com a inclusão de um indicador de avaliação denominado A2)
- A assiduidade como o indicador principal da avaliação de desempenho (para se obter o Excelente é necessário 100% de cumprimento do serviço lectivo e para se obter o Bom é necessário 95%. Isto significa que um professor com 94,5% de assiduidade, mesmo que tenha Muito Bom ou Excelente nos trinta e tal indicadores de avaliação a que foi sujeito, terá automaticamente Regular só por causa da assiduidade…
O absurdo é tal que basta a um professor durante o ano todo SÓ chegar atrasado 5 minutos ou faltar a 45 minutos por motivos inimputáveis á sua vontade- um acidente, um imprevisto, etc.- que perde o direito a ser avaliado com Excelente!...
Fazendo uma analogia, seria o mesmo que dizer aos alunos que bastava chegarem uma única vez atrasados a uma aula durante o ano todo, que perdiam o acesso à classificação 20 valores, independentemente do trabalho que fizessem...)
- Resultados escolares dos alunos (a perigosa perversão resultante deste parâmetro é evidente: a autoridade do professor fica debilitada pelo aluno que tenha consciência que um seu mau resultado afecta pessoalmente o professor; a compreensível inflação das classificações com o estabelecimento de metas de percentagens de positivas; o trabalho individual do aluno bem como o contexto sócio-económico, influenciam os resultados; segundo um estudo da Universidade de Bristol, a qualidade do professor só afecta em 30% a qualidade do aluno; a qualidade da avaliação externa (vulgo, exames) não é resultante do desempenho individual do docente, bem como os respectivos critérios de correcção;)
- Abandono escolar (disfuncionalidade familiar e individual, mau contexto sócio-económico, não é resultante do desempenho individual do docente)
- Relação com a comunidade (nem sempre existe contextualização curricular para estabelecer relações com a comunidade não educativa)
- Objectivos individuais (como é possível existirem objectivos individuais num sistema que funciona maioritariamente com trabalho de equipa e com órgãos colectivos- conselho de turma, conselho pedagógico, área disciplinar, departamento curricular, etc.? Este modelo potencia a competição individualista criando uma entropia perigosa num sistema educativo construído para trabalhar num contexto colectivo…)
- Subjectividade elevada dos indicadores de avaliação (a distinção entre as diferentes classificações é muito ténue; a diferença entre um Bom e Muito Bom ou entre este e Excelente, baseiam-se em minudências que dependem exclusivamente da arbitrariedade e discricionariedade do avaliador, existindo o perigo de instintos persecutórios, desavenças pessoais ou humores emotivos, influenciarem a classificação)
- Instrumentos de registo da avaliação com 33 indicadores (16 a cargo do avaliador e 17 a cargo do Director. Considerando que cada indicador de avaliação tem de possuir 5 descritores, as grelhas de avaliação apresentam um total de 165 descritores que podem ser utilizados…)
- Aumento do horário semanal de trabalho (de forma encapotada, o horário semanal aumentou porque muitas das actividades não lectivas são realizadas em horário pós-laboral. As substituições de docentes são actividades realizadas em contexto de sala de aula, com um plano, e portanto, são lectivas; por decreto, convenientemente retira-se o estatuto de lectiva para não se pagarem horas extraordinárias. Quando um docente substitui outro por ausência prolongada, fica em cada semana com mais turmas e portanto, com mais horas lectivas semanais sem qualquer retribuição).
- Avaliador ser opositor ao mesmo concurso que o seu avaliado e às quotas das classificações (no caso do projecto de considerar a avaliação de desempenho para efeitos de concurso nacional de professores, o avaliador que quiser concorrer terá isenção na avaliação dos seus avaliados que também concorrem sabendo que as classificações dão bónus na graduação? Com quotas para Excelente e Muito Bom a que também concorre, também terá isenção?)
- Número de aulas avaliadas (como é que observando 2/3 aulas, numa média de 150 aulas por ano em cada disciplina, determinam a qualidade do professor? Como aceitar a avaliação de alguém que sabemos que não é melhor do que nós na mesma função?)
- Carreira única e níveis de ensino diferentes (não existe distinção entre os diferentes níveis de ensino, de acordo com as suas especificidades. Leccionar ao 1º Ciclo/2º Ciclo não é igual a leccionar ao 3º ciclo ou Secundário. Tal como leccionar Matemática não é igual a leccionar Biologia ou Português ou Inglês ou Educação Física ou etc.).
- Gestão escolar (actualmente, os gestores das escolas são nomeados, enquanto antes eram eleitos mediante a apresentação de um programa eleitoral. A nomeação é feita por um orgão chamado Conselho Geral, onde o corpo docente está em minoria, sendo, em várias escolas, a maioria composta por políticos autárquicos (câmara e juntas de freguesia). Acho que não é preciso explanar mais...
Existiu um evidente retrocesso democrático, tornando a escola alvo de potenciais conflitos políticos e ser uma arena onde se podem dirimir problemas alheios à comunidade escolar…)

E muito haveria para discutir. Acrescente-se as dezenas de escolas que não possuem condições materiais dignas, a falta de condições físicas de trabalho para os professores, a sobrelotação das turmas e das escolas em algumas regiões, a falta de recursos humanos não docentes, a diminuição do investimento, e o caldo já está entornado…
O problema da educação, é que é usada como arma política e eleitoral, em vez de ser gerida por critérios técnicos. Conjuntamente com o futebol, também é um sector onde existem muitos professores de bancada sem possuírem a especialização ou as habilitações académicas para opinar fundamentadamente, e que com as suas opiniões levianas só desestabilizam um sistema complexo.
Nesta síntese não coloquei propositadamente o mais importante mas o menos reconhecido: o assassinato por este ECD das relações interpessoais e da dimensão humana, factores essenciais numa escola. Sem estes factores, o trabalho colaborativo deixa de o ser porque sente-se a desconfiança, o soar a falso, a hipocrisia. Ao testemunhar a implementação do SIADAP nos funcionários não docentes, vislumbrei o cataclismo interpessoal que iria ocorrer na classe docente, porque o presenciei entre esses funcionários. Trabalhar num local sem afectividade, com conflito de interesses, ferozmente competitivo, endurece-nos emotivamente e só vai amplificar o que já se passa na sociedade em geral. Considerava a escola o último refúgio para combater o modelo filosófico do individualismo como apanágio da sociedade ideal e produtiva, mas temo que tenha sido expurgado definitivamente.
A escola é uma instituição onde é fundamental a existência de relações interpessoais saudáveis, desinteresseiras e harmoniosas, onde a afectividade tem de ser positiva, sob pena de todo o processo educativo estar comprometido, mas que este ECD não promove.




Imoralidade abjecta

É assombroso a facilidade com que o governo protege os interesses da banca e dos grupos elitistas que a suportam. Vamos pagar com impostos e diminuição quantitativa e qualitativa dos serviços públicos, a dádiva de dinheiro público para salvar o enriquecimento ilícito dos banqueiros.
Curiosamente, o caso BPN tem como principal protagonista um ex-governante das Finanças, o que faz inferir sobre a utilização de informação privilegiada para beneficio próprio. Imagine-se o contributo do Macedo no BCP…

Boa jogada politica

Estando a crise da educação num impasse critico, em que a ruptura está iminente e qualquer uma das partes que ceda está irremediavelmente comprometida, a sinistra faz a jogada táctica de aparentar cedência, mantendo o essencial na mesma, como assombrosamente admitiu na conferência de imprensa. A bola está do lado dos professores, e veremos se rematam para canto…

Ela ainda anda por aí...

...a ditadura, claro...

Os membros eleitos do conselho de redacção (CR) da Lusa, órgão que tem por objectivo supervisionar o cumprimento das regras editoriais e deontológicas dentro da própria agência, estranham que os redactores de economia "tenham sido proibidos de utilizar a palavra estagnação para qualificar a evolução de 0,1 por cento prevista para o PIB português em 2009".
Em causa estão os dados mensais de desemprego divulgados pelo IEFP em Outubro. "Ao contrário do que é uso, a jornalista autora da peça recebeu orientação para fazer outra peça a destacar que os Açores tinham sido a região onde o desemprego mais tinha caído em Setembro", indica o comunicado do CR. Isto no último dia da campanha eleitoral nos Açores e quando o comentário divulgado pelo IEFP abria a referir "as regiões em que [o desemprego] tinha aumentado". "Por exemplo, não se fez qualquer peça à parte quanto aos locais onde o desemprego mais subiu", acrescenta também o comunicado, sublinhando que "a Lusa não ficou bem na fotografia".
Mais de 50 por cento do capital da agência Lusa pertence actualmente ao Estado, enquanto os grupos Controlinveste e Imprensa são outros dois accionistas importantes, cada um com mais de 20 por cento. A administração da empresa é nomeada pelo Governo. PÚBLICO

19/11/08

A revolta dos ovos

Umas dezenas de ovos e dois dias depois, uma ministra viu-se na contingência de alterar o que muitos já tinham dito que estava errado. A conclusão deste episódio é que os alunos têm mais poder reivindicativo do que os adultos profissionais do ensino (vulgo, professores), e que conseguiram em poucos dias o que centena de milhar não conseguiram em 8 meses. Daqui se vê a degradação do estatuto social de uma classe...

02/11/08

Motivos para a revolta

A crispação social latente, que se manifesta através de alguns fenómenos secundários visíveis (aumento da contestação na rua, participação em manifestações de muitos cidadãos que jamais participaram em actividades semelhantes, etc.), é resultado de 4 leitmotiv:
- a hipocrisia e demagogia execrável do actual governo
- o assassinato do estatuto social e profissional de algumas classes profissionais (professores, militares, magistratura, etc.)
- o modelo sócio-económico escravizante, gerador da desigualdade social que aumenta aritmeticamente
- a despudorada e descarada corrupção endémica nos quadros dirigentes da Administração Pública e nos altos quadros do sector privado

Por tudo isto, qualquer manifestação tem todos os motivos para não ser participada por um só grupo social mas por todos os cidadãos cumpridores do país.
As vitimas são sempre os cidadãos comuns, que mostram sinais de saturação e da radicalização da luta social. Confesso, que também me incluo neste rol de indivíduos...

Karl Marx, volta que estás perdoado

Durante décadas estigmatizou-se o comunismo com a cartilha do papão e em pleno séc.XXI usa-se o método económico comunista para acudir aos devaneios corruptos da economia de mercado capitalista. A nacionalização dos bancos é um exemplo paradigmático do uso do modelo comunista; com o recente anuncio da nacionalização do BPN por causa da corrupção que grassou neste banco, o ideal marxista foi ressuscitado.
Mas o que é incrível, é que a população não grita a sua revolta ao constatar que o Estado durante 3 anos destruiu o serviço público com o argumento da eficiência capitalista privada, desinvestiu com o argumento da falta de dinheiro, e agora miraculosamente, tem milhares de milhões de euros para DAR aos bancos, para que estes se mantenham a funcionar e a pagar aos accionistas que causaram esta crise com a sua ganância.
Neste momento, qualquer cidadão deve desobedecer civilmente à autoridade do Estado, sempre que este invoque falta de financiamento para os serviços públicos, carreiras profissionais e remunerações. Como disse o coronel Vasco Lourenço: “se estivéssemos na década de 60, estavam criadas as condições para um golpe militar. Não se deve coarctar a cidadania ao povo, e muito menos a quem tem uma arma na mão”.
O cidadão comum pode não ter uma arma, mas pode ter a motivação para a adquirir, tendo toda a legitimidade para o fazer.

01/11/08

Fogo de vista

O fogo de artifício tipo Magalhães, Novas Oportunidades e computadores e-escola, servem para entreter o povinho e iludi-lo dos verdadeiros problemas que entretanto vão persistindo:

O Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) desactivou vários postos de atendimento e chega a ter apenas seis ou sete pessoas para atender as chamadas de socorro de cinco distritos do País.
Há sete meses que a central de Lisboa do INEM deixa por atender centenas de chamadas por dia, um escândalo denunciado pela TVI há 2 semanas.
A ministra da Saúde e a direcção do INEM parecem impotentes para resolver o problema, que todos os dias põe em risco a vida de muita gente da Grande Lisboa e do Alentejo.

Sentido de Estado

Aquilo que o PM não tem. Numa alocução completamente inoportuna, emitida na cimeira internacional com o objectivo de discutir a crise internacional, fez propaganda comercial sobre o computador Magalhães, em plena reunião intergovernamental.
Um PM que não tem noção do ridiculo demonstra bem o tipo de pessoas que podem chegar ao poder neste país...

Tema aglutinador

A iniciativa de afrontar um governo publicamente é um acto de desespero, de pessoas que vislumbram o descalabro eminente. Um exemplo paradigmático desta afronta são as dezenas de movimentos espontâneos nas escolas contra mais uma avalanche legislativa sem nexo e qualquer fundamento pedagógico. Nunca na classe docente se viu tamanha união, conhecendo a normal diversidade de pensamento que espartilhou sempre qualquer acto solidário. Uma desobediência civil assombrosa tendo em consideração o tradicional comodismo do povo português; mas o que é extraordinário á a assombrosa arrogância e desprezo por parte da classe dirigente, num sinal claro de castrar a cidadania. Talvez a contraproducência do acto tenha consequências inimagináveis…