25/08/11

A imutabilidade de algumas coisas...

Medina: "Taxar os ricos? As fortunas mexem-se e escondem-se"


Como surgiu a ideia da reforma sobre a tributação dos bens mobiliários?
O antigo ministro das Finanças, António Sousa Franco convidou-me para presidir à Comissão de Reforma de Tributação do Património que pretendia começar a taxar os bens mobiliários. Tive uma reunião com o então primeiro-ministro António Guterres em 1996, onde lhe apresentei a proposta para taxar os bens mobiliários, um mecanismo eficaz de cobrança destes bens e ele concordou. O Guterres estava de acordo. Existia, portanto vontade política para avançar com a reforma da tributação dos bens mobiliários.


Qual o mecanismo que propunha no estudo?
O mecanismo que eu propus no livro era muito simples: vamos imaginar que você tem acções num banco, as finanças quando quiserem cobrar o imposto sobre as acções não vão cobrar as acções ao titular mas vão cobrar ao banco onde elas estão depositadas. Assim é impossível os bens mobiliários fugirem à tributação.


E como é que reagiram os banqueiros a este mecanismo de tributação previsto na sua reforma?

Os banqueiros reagiram mal a este projecto. Eu tive uma reunião com o presidente da APB (Associação Portuguesa de Bancos) na altura, João Salgueiro e com representantes dos vários bancos. Apresentei-lhes a proposta na reunião e ninguém levantou objecções. Mas em 1997, começaram-me a chegar aos ouvidos queixas dos bancos sobre este mecanismo de tributação. Então, eu virei-me para o Sousa Franco e disse-lhe: Eu quero falar com o primeiro-ministro. E assim foi, tivemos um almoço, no dia 8 de Abril de 1997. No almoço, estava eu, o Sousa Franco e o António Guterres. Eu disse ao primeiro-ministro: Se você não concorda, eu saio já. O António Guterres apoiou-me e continuei a trabalhar.
Quando o Sousa Franco saiu do Governo em 1999, e o Pina Moura veio para o seu lugar, a reforma foi enterrada. Este episódio levou-me a sair do PS nesse ano. A única pessoa que se mostrou favorável à tributação dos bens mobiliários na altura, foi um deputado do PCP que já morreu. A única tentativa de um Governo taxar os bens mobiliários foi com o António Guterres, desde então nunca mais nenhum governo falou sequer nisso.


Quais as dificuldades de cobrar imposto sobre os bens mobiliários?

A riqueza mobiliária mexe-se e esconde-se. Uma pessoa até pode agarrar nos títulos e escondê-los debaixo da cama. As grandes fortunas são mobiliárias. No século XIX, as pessoas ricas tinham tudo em bens imobiliários, hoje em dia já não. As grandes fortunas estão todas em bens mobiliários. Existe uma dificuldade técnica para cobrar o imposto sobre os bens mobiliários.


Entrevista a Medina Carreira, DN

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