14/06/08

Dois monumentais ladrões

Com este exemplo, a justeza de recorrer a métodos duros para paralisar o país é incontestável. Tanto as empresas petrolíferas com o Estado são dois ladrões e vigaristas, sem ética, que recorrem a estes expedientes para se besuntarem com lucros imorais. Jamais teremos uma sociedade com ética e moral equanto tivermos as instituições de poder a agir desta maneira...
Bombas de gasolina pagam combustível que não recebem
14.06.2008, Sara Santos Silva - PÚBLICO

Diferença de temperatura entre o momento do enchimento do camião na refinaria e a descarga no posto origina volumes diferentes
Os revendedores independentes de combustível estão a ser lesados nos abastecimentos que são realizados pelas grandes companhias petrolíferas, facto que já motivou, pelo menos, duas acções judiciais contra estes fornecedores. O presidente da Associação Nacional de Revendedores de Combustível (Anarec) conhece o problema e disponibiliza os serviços jurídicos da associação a todos aqueles que, individualmente, não tenham condições para accionar as grandes companhias.
Na origem do problema está um fenómeno físico de relação entre temperatura e volume: quanto maior for a temperatura na altura do enchimento dos depósitos, maior será o volume de combustível registado. Os revendedores pagam às petrolíferas o volume de combustível existente à temperatura a que são feitas as cargas dos camiões transportadores que, geralmente, variam entre os 16ºC e os 30ºC. Mas, à chegada do camião ao posto de abastecimento, a temperatura é mais baixa, o que faz com que o volume de combustível seja menor. Assim, um camião que seja carregado com 14.000 litros de gasóleo a uma temperatura de 27,2ºC pode chegar ao seu destino apenas com 13.860 litros, se a temperatura aí registada for de 15ºC. Entretanto, esse revendedor pagou à petrolífera IVA e Imposto sobre Produtos Petrolíferos (ISP) relativos aos 14.000 litros. É uma dupla penalização, uma vez que paga produto que não recebeu e ainda assume impostos sobre essa mesma carga que não lhe chegou.Já as petrolíferas saem duplamente beneficiadas: recebem por litros que não chegaram a sair dos seus reservatórios e ficam com uma pequena parte do ISP cobrado, uma vez que só entregam à Direcção-Geral das Alfândegas o imposto relativo aos 13.860 litros, dado que a temperatura de referência fixada pelo Estado para o cálculo do ISP é de 15ºC .
Mas se ao nível do ISP o Estado recebe apenas o que está convencionado, já ao nível do IVA sai beneficiado, uma vez que este imposto é calculado sobre os 14.000 litros à saída da refinaria, sem qualquer correcção.
Questionada pelo PÚBLICO, Rita Macedo, da Galp, confirmou que a Petrogal, "como qualquer outro operador petrolífero, abastece e factura os seus clientes, distribuidores e grossistas (...) à temperatura a que o produto se encontrar armazenado no momento (fruto das condições climatéricas à data)".
Quem não aceita a explicação da Petrogal é José Canedo, revendedor independente de combustível em Montalegre, Vila Real, que alega que as temperaturas das cargas nada têm a ver com a temperatura ambiente. Para isso recorre a um exemplo concreto: a 29 de Fevereiro deste ano, um camião abasteceu, na petrolífera de Leça da Palmeira, gasóleo, gasóleo corado, gasolina sem chumbo 95 e sem chumbo 98. A guia de saída mostra que as gasolinas se encontravam a uma temperatura entre os 14ºC e os 15ºC e os gasóleos a 27ºC. "Procurando, encontra-se facilmente casos de carregamentos que são feitos no Inverno, às 05h00 da manhã, e que atingem 26ºC e 27ºC", garantiu ao PÚBLICO.
José Manuel Antunes tem uma explicação para o silêncio da autoridade: o Estado não intervém porque é cúmplice da situação. "O ISP é cobrado à temperatura de referência de 15ºC, mas o IVA é pago à temperatura que é abastecido, ou seja, o Estado recebe IVA por uma parte do combustível que não existe".

Diferença de valores

14.06.2008

Em Fevereiro de 2008, José Canedo foi abastecido com oito camiões de combustível. A diferença entre o carregamento à temperatura de enchimento e, depois, à chegada ao posto foi de menos 1100 litros - 932 euros a mais. Desse valor, 162 euros foram pagos ao Estado sob a forma de IVA.
Extrapolando a situação para os 460 proprietários de postos de bandeira branca, os que não são detidos directamente pelas petrolíferas, as companhias fornecedoras teriam ganho, num mês, 428.720 euros por 506.000 litros de combustível que não chegaram à temperatura de 15ºC.

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